ÁGUAS DE VERÃO

Cleide Canton

 

Se ora me deito nessa longa espera

ou se me perco, ainda, olhando estrelas,

que bom seria quando, ao esquecê-las,

ficasse o brilho neste olhar. Quem dera!

Se o vento cala o canto dividido

entre as vacâncias desta calmaria,

eu me pergunto, então, como seria

o trovejar do amor nunca esquecido.

Enquanto afago a chaga semi-aberta

secando ao sol, devasso e imprevidente,

a chuva leva o broto da semente

que sem querer vingou em lua incerta.

Lá vai ele no rio que segue ao mar,

temendo ver, após as corredeiras,

o rebentar das livres cachoeiras,

onde o temor maior é naufragar.

Na queda brusca o grito, então clemente,

em tom maior quiçá mudasse a morte

e sorriria, entregue à própria sorte,

o amor audaz, prodígio dissidente.


SP, 10/02/2010

16:00 horas

 

APAGA A LUZ, SECA O MAR

Cleide Canton

 

Apaga a luz da tua janela,

eu te peço, por favor!

Enquanto meus olhos tristes

perceberem que não dormiste,

estarão em ti os meus sonhos de amor,

acanhados numa longa espera

neste fim de primavera.

Fecha a porta do teu quarto.

Se a sei entreaberta

o desejo me desperta.

Não plantes outra flor em teu jardim.

Far-me-ás pensar

que ainda esperas por mim.

Pinta de outra cor a fachada...

Quem sabe assim

convenço-me de que para ti sou nada.

Se quiseres ouvir nossa música,

ouve baixinho,

para que eu não me engane

e não corra para o nosso ninho.

Se quiseres que eu não mais pense em ti,

apaga também as estrelas

e muda a rota da lua.

Embaça os vidros da janela

para que eu não veja o sol chegar,

manda bem longe os passarinhos

para que não me acorde o seu cantar.

Se quiseres mesmo que eu te esqueça,

peça ao céu que meu sonho esmoreça

e mande anjos fecharem meu olhar,

pois não deixarei de pensar em ti

enquanto ainda houver uma gota

na profundeza no mar...

 

LEVANTA
Cleide Canton

 

E agora, o que fazer, meu caro amigo,

das sombras que povoam teu sonhar,

da vida que deixaste naufragar

em naus que nunca foram teu abrigo?

A vida que buscaste, em descaminhos,

sem nada aprimorar dos teus talentos

reveste-se de mágoa e os teus lamentos

se perdem nos escombros dos teus ninhos.

Bebeste em cada mesa hoje deserta.

Zombaste até dos teus, em cada esquina,

enquanto aquela febre que arruína

lustrava-te a vaidade, em hora incerta.

E agora tu caminhas, sem sossego,

no escuro deste vale, arrependido,

buscando o que te fora prometido

no peito onde não tens mais aconchego.

E lágrimas de dor lavam a rua

por onde pisas sem sentir o chão.

Mas eu te digo: Escuta o coração

e busca nessas poças tua lua.

Talvez o brilho dela te convença

que nunca é tarde para um recomeço,

porque tu já pagaste um alto preço

nas dores que sofreste por sentença.

És livre! Tens a bênção do divino,

o Deus que te perdoa e te engrandece.

Abraça o teu momento! O mal perece.

Levanta e traça belo o teu destino.

Enterra o teu passado, não importa

que dele pouco reste ou aproveite.

Se queres a beleza, dá o aceite

e os sonhos tornarão à tua porta.

Semeia todo amor sem renegares

a terra em que passaste, indiferente.

O mundo é teu, mas cuida consciente,

e colherás, um dia, o que plantares.

SP, 15/01/2011

10:30 horas

 

 

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

 

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Betsy
 
 

 

 


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